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sexta-feira, 19 de abril, 2024
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Senhor do tempo no Flamengo, Diego Alves administra minutos para valorizar momentos

Da cera que irrita aos rivais ao descanso quando necessário, goleiro usa experiência para ser novamente decisivo na Libertadores, questiona calendário e fala da relação com o torcedor Diego Alves fala sobre a expectativa antes da final: “Colhendo o que a gente plantou”
O tempo é algo que Diego Alves aprendeu a administrar bem com a camisa do Flamengo.
Quando necessário, gasta com a chamada “cera” para que a equipe ganhe segundos preciosos em busca da vitória. Ao longo de mais de 15 anos como profissional, tem nele um aliado para fazer da definição “experiente” um adjetivo positivo aos 36 anos. E para se manter em forma, equilibra o tempo em campo e de descanso, sendo poupado quando preciso.
Diego Alves disputará sua segunda final da Libertadores
Reprodução Instagram Conmebol
Intimidade de quem usa o tempo a seu favor até mesmo na, para muitos, angustiante contagem regressiva até as 17h (de Brasília) do próximo sábado, quando Flamengo e Palmeiras decidem a Libertadores da América, no Estádio Centenário, em Montevidéu.
Há mais de quatro anos no Flamengo, Diego Alves teve tempo suficiente para entender o que a competição representa para o clube. Campeão em 2019 como protagonista e um dos capitães, entendeu que era questão de tempo transformar a geração questionada pelas frustrações de 2017 e 2018 em uma das maiores da história do clube. Conquistas que tornaram o tempo irrelevante para a dimensão do que levantar troféus como o da Libertadores são capazes de transformar na trajetória de um jogador.
– Não temos a dimensão do que representamos. Vamos falar: “Eu sei, sou jogador do Flamengo, reconhecido”. Mas não. Não temos o poder de saber onde alcançamos. Foram vários momentos, mas tem um menininho que conseguiu contato através da minha esposa. Ele tem uma deficiência mental e física. Lembro que pediram um vídeo, ele estava na cama sem fazer nada, e fiz um vídeo motivacional, mandei uma luva e uma camisa. Logo em seguida, a mãe dele mandou um vídeo dele já em pé, cantando, limpando a casa, querendo varrer com ajuda.
Diego Alves pede mudanças no calendário: “Temos que cuidar do futebol brasileiro”
“Não é só futebol. Isso é só uma parte pequena do que podemos representar. Por isso, levamos uma responsabilidade grande perante o que temos do outro lado. Quem está aí, quer que a gente renda o máximo e respeite. E é isso mesmo, porque daqui a 10 anos vão estar falando da gente. Mas vivemos tão intensamente esse lado aqui que não temos tempo de desfrutar esses momentos”
A experiência deu a Diego Alves também a capacidade de administrar o próprio tempo na reta final da carreira. Com 47 partidas, é o segundo jogador que mais entrou em campo pelo Flamengo na temporada – atrás apenas de Willian Arão – e entendeu que menos tempo em campo significaria melhor forma física para a final da Libertadores. Poupado em partidas no início de novembro, chega a Montevidéu 100%, mas sem deixar de lado um ponto que cada vez mais interfere na performance em alto rendimento: o tempo para trabalhar.
– Não estou falando somente como Flamengo, estou falando como jogador de futebol profissional. O Guardiola reclama do calendário na Inglaterra, mas se você for ver o número de jogos do City, que deve ser 60 e alguma coisa, imagina nós aqui? O futebol brasileiro é muito bom. Temos que dar valor e cuidar do futebol brasileiro, mas cuidar com todos que querem cuidar.
“Não adianta criticar e só criticar sentado. Temos que trabalhar para ajudar e ver o que pode ser feito para melhorar. É um tema importante e não é desabafo, é o que eu sinto. Desde que voltei, eu já via jogadores desgastados e não tinha noção. Hoje, sinto na pele”
Diego Alves dedicou 21 minutos de seu tempo em entrevista ao ge para falar da final da Libertadores. Acabou indo muito além disso. Falou sobre a preparação para encarar o Palmeiras, sim, mas sobre a influência do jogador de futebol no torcedor, nos rumos do calendário do futebol brasileiro, passou a limpo todos os clubes de sua trajetória e projetou o futuro. Afinal, não há muito mais tempo a perder. Confira a íntegra!
Ainda bate nervosismo para final?
– A ansiedade existe. É normal aquele friozinho na barriga a medida que vai chegando perto do jogo, preleção.. Acho que se perder isso o jogador de futebol perde a emoção que o move. Só que vivemos em um calendário tão apertado, tão justo, que estamos jogando e não conseguimos digerir a vitória, a derrota. Então, você tem que ganhar e no vestiário já pensar no outro jogo. É uma situação difícil de conviver. Mesmo sabendo que há um grande objetivo no dia 27, é normal comentar, conversar, e quando chegar perto vem a ansiedade boa, não aquela que te deixa influenciar. É mais uma oportunidade de levantar um troféu tão histórico e conquistar o tricampeonato.
Diego Alves era um dos capitães em Lima
Getty Images
Certamente mexe com a emoção, a torcida, tudo que move. Vocês da imprensa jogando favoritismo, pressão… Já sabemos tudo que envolve, mas temos a consciência do que temos pela frente e vamos tentar no dia 27 estar 100% focados para levantar mais esse troféu.
Preparação em casa
– Cada jogador tem a sua maneira de se motivar. Eu fico com a minha família em casa, fico bem tranquilo. Costumo ficar tranquilo antes dos jogos, penso em coisas boas, visualizo… Tem gente que gosta de meditar, de orar, cada um com sua maneira de concentrar. Acho que o sofrimento prévio muito antes faz mal. São vários os objetivos. Quando você joga em time que está sempre competindo em alto nível, o pensamento é sempre em vitória, vitória. Isso te condiciona a pensar no próximo jogo.
Diego Alves fala sobre mais uma final de Libertadores pelo Flamengo: “ansiedade mexe”
Não é que falamos da boca para fora. É o que te condiciona. Porque se você perde o próximo jogo, você tem pressão e isso influencia em alguma coisa. Mas neste dia 27 em particular acredito que o time que acordar melhor… Vimos ao longo dos anos que nem sempre o favorito ganha, nem sempre o melhor ganha, a melhor campanha. Por experiência própria, sabemos que temos que nos concentrar ao máximo para isso e desfrutar no dia 27 fazendo o que sempre fizemos. Os torcedores sabem que nesses dias chegamos para valer e gostamos desses dias importantes.
Jogo sem favoritismo?
– Em 2019, 90%, 80% da imprensa dava o River como favorito, mais experiente, mais cascudo, que o Flamengo não chegava, essa base não estava acostumada, e conseguimos ganhar uma Libertadores em praticamente dois minutos. Demonstra que vale o momento, a concentração. Tudo que influencia o jogo, parte de imprensa, pressão, não entra em campo. Tudo isso vai por água abaixo quando levanta o troféu. Aí, tudo que aconteceu antes não vale. É tudo para gerar debate e repercussão. São 42 milhões de torcedores, imagina o quanto que eles não querem escutar sobre a partida. Então, tudo isso é normal.
Diego Alves foi herói contra o Palmeiras na Supercopa
Reuters
Desgaste ao longo da temporada
– É muito importante esta pergunta. Vivemos em um mundo onde todos querem nos ver dentro do campo e não sabem o que acontece fora. Você (repórter) viu um pouquinho do que é a parte extra do profissional, a dificuldade que é. Me sinto muito bem, me sinto saudável, mas esse ano podemos chegar a quase 90 jogos. É uma situação muito crítica. Não é preparação física ou departamento médico, é a realidade. Estamos jogando de dois em dois dias. Como que um atleta de alto rendimento consegue render todo ano jogando de dois em dois dias sem ter tempo de treinar?
Você vai pegar qualquer atleta de alto rendimento e ele treina dois meses para disputar a competição, e rende. Tivemos quase 15 dias de férias em 2020, entramos nas competições e sabemos que tudo foi se arrastando devido a pandemia. É um tema muito importante de vocês que criam debate debaterem. É uma forma de corrigir. A partir do momento que você tem um jogador que não pode render o máximo dele, como cobrar um grande espetáculo? O jogador não tem tempo para descansar, recuperar e treinar.
Diego Alves desfalcou o Flamengo para ser poupado para Libertadores
André Durão
Isso não é desculpa. Joguei 65 jogos em 2019, disputamos a final do Mundial com 82 e o Liverpool 24. É uma coisa para se debater. Só para você ver o desgaste. Eu com 36 anos poder ser o segundo jogador do time com maior minutagem, mostra a importância de se cuidar e dar sorte de não se machucar. Em 2020, tive lesões, mas devido a isso de ter que estar sempre 100% o atleta tem que se antecipar no retorno da preparação.
Ganhar tudo é obrigação?
– Jogamos no Flamengo, né!? É a primeira coisa. Quando se joga aqui, a obrigação de títulos é importante e o sarrafo que deixamos é alto. Quando cheguei aqui no meio de 2017, o Flamengo tinha alguma coisa que não passava das oitavas na Libertadores. Chegou na final da Copa do Brasil e perdeu nos pênaltis. Foi uma geração que o pessoal chamou de geração não sei o quê. Muitas coisas influenciaram, e nós, que vivemos esse momento, mudamos essa imagem. Quando você muda e deixa o nível alto, a cobrança por títulos é importante, mesmo sabendo que às vezes é quase impossível – e volto no calendário – conciliar três competições.
Diego Alves sobre a cobrança por títulos no Flamengo: “Não quer pressão, não vem pra cá”
Dizem: “Ah, mas investiu tanto!”. Não é um problema de investimento. Se fosse por investir, o Manchester City tinha que ganhar tudo todo ano, o PSG, e não ganham. É difícil, mas estamos colhendo o que plantamos. Plantamos coisas grandiosas e isso nos deixa muito em evidência. Existe esta pressão por ser jogador do Flamengo, por representar um time de 42 milhões de torcedores. Quem vem para o Flamengo sabe da importância. Se não quer pressão, não vem para cá. Sabemos que a partir do momento que veste a camisa, a mira está para você. Convivemos com isso sabendo que quando ganha não é o melhor e quando perde não é o pior.
O Flamengo na vida de Diego Alves
– Tive passagens por clubes que foram muito importantes. Comecei no Atlético-MG num momento muito difícil, rebaixado para a Segunda Divisão, e subi campeão da Série B jogando aos 20 anos. Fui campeão mineiro depois de sete anos que o clube não vencia o Cruzeiro e fui vendido para Europa. No Almería, tive aprendizado incrível com preparadores de goleiros, coisas que aqui no Brasil não iria aprender. De lá, fui para um Valência que era o terceiro time da Espanha até que chegaram as gerações de Guardiola, Cristiano Ronaldo, Messi… Claro que gostaria de ganhar títulos. Cheguei a duas semifinais de Europa League e perdi no último minuto. Tive um aprendizado muito grande em dez anos. Quando você fica tanto tempo na Europa, é tão importante quanto um título. É uma história que se cria em outro continente
Voltando para o Brasil, não tem como negar o peso do Flamengo no Diego Alves. A visibilidade, tudo que conquistei… Com certeza, o Flamengo tem um peso diferente na minha carreira, não tenho como negar. Conquistei títulos que fazia 40 anos que o Flamengo não ganhava. Tenho certeza que o torcedor tem o mesmo sentimento. Eu tenho gratidão por ter participado, e o torcedor tem a gratidão por eu ter ajudado. Torcedores que nunca tinham visto o Flamengo ganhar uma Libertadores, um Brasileiro…
Futuro da carreira
– Já estão tentando me aposentar há uns quatro anos. É normal (risos). Enquanto eu estiver saudável, me sinto bem no meu território dentro do campo. Também não quero ser aquele cara que quando não tem a emoção e alegria não vai prestar o serviço que gosta. Não coloquei metas. Quero curtir o momento. Aqui no Brasil, às vezes as pessoas aposentam você. Tomou gol, falam: “Olha a idade dele”. Vai bem: “Ele é experiente”. Já me acostumei com isso e sei do que represento, da minha importância. E a garotada é importante para poder passar o bastão sem nenhum egoísmo, sem dependência. Sei da minha importância dentro e fora de campo e no que eu puder ajudar vou estar à disposição.

Fonte: Globo Esporte

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